Era uma vez uma jovem que sempre gostou de muitas coisa! De estudar história e biologia, de desenhar, escrever, criar e viajar. E por muito tempo essa "falta" de foco a perturbou, afinal, sempre acreditou que sinônimo de fazer algo bem feito e ter reconhecimento por tal, só se for se dedicando para uma única e exclusiva coisa.
Na última semana fui assistir ao documentário "Filme Paisagem, um olhar sobre Burle Marx". Não poderia deixar de ver o filme que conta a história de um ícone no paisagismo no Brasil, além de uma grande figura para a botânica brasileira, uma vez que descobriu nada mais nada menos do que 100 espécies nativas de plantas.
Com uma forma bem característica de criar jardins, o carioca e filho de uma pernambucana com um imigrante alemão, Roberto Burle Marx, em sua posição de previlégio, homem, branco e de familia rica - que fique aqui bem claro que objetivo desta observação está longe de diminuir seu trabalho mas, ao mesmo tempo, não se pode desvincular o seu sucesso de seus previlégios - foi responsável por um trabalho como paisagista digno deste belo filme/documentário e desta homenagem.
O filme mescla entre imagens de acervos do próprio paisagista e cenas belamente montadas que, somadas com a narração de trechos escritos pelo próprio Burle Marxs por Amir Haddad, nos leva a conhecer sua vida, seus sonhos,medos e as belas descobertas que puderam resultar em seu gandíssimo trabalho.
Resultado?!
Um filme que já vale muito a pena por se tratar da história de um personagem de peso para a cultural brasileira e pelas belas imagens resultantes de um primoroso trabalho de direção de arte que, de forma natural, nos leva a nos sentir mais próximos da natureza, da vontade de comtemplá-la e preservá-la.
Porém, mais do que isso, o filme teve a delicadeza de tocar em um ponto que não poderia deixar de comentar, afinal, mais do que uma grande referência para minha profissão como paisagista, botânico e ecologista, Burle Marx é referência de SER, da forma como viveu e que, consequentemente, refletiu no seu SER profissional de destaque.
Logo já no início do filme um dos relatos de Burle Marx é relembrando uma fala de seu pai para com ele de quando era pequeno, lhe dizendo que ele permitiria que ele escolhesse ser o que ele quisesse, mas que ele exigiria de Burle Marx que então ele fosse o melhor naquilo.
Também no filme, Burle Marx relata no filme o quanto gostava, desde muito pequenininho, de plantas, e relembra quando ganhou de sua tia uma belíssima espécie de Alocasia, e que naquela noite não conseguia dormir de tão eufórico que ficou, mas, ao mesmo tempo, ele já se sentia muito atraído pela música e pelas artes plásticas, optando, quando mais velho, pelo curso de belas artes como porta de entrada para todas as outras áreas de seu agrado.
E a fala de seu pai ?!
Não vamos negar que foi um pouco regada ao autoritarismo e alto grau de cobrança dignas de um alemão, entretanto, foi com essa fala que Burle Marx se permitiu SER o que quisesse, ao mesmo tempo que buscava SER o seu melhor em todas, mesmo que várias, as escolhas feitas.
Burle Marx fez artes plástica, sim, e trabalhou como pintor e escultor, mas, também, com joalheria, música, botânica, ecologia, gastronomia e, é claro, o paisagismo, tudo com o diferencial de enxergar suas interdependência e, principalmente, deixando seu brilhantismo em cada uma dessas suas atividades como resultado de sua escolha.
E qual a sua escolha?
Desenvolver aquilo que ele sentia ser seu propósito, o que lhe dava prazer, independente de rotulações diferentes, ele resolveu escolher SER, escolheu se permitir e dar o seu melhor.
E aquela jovem lá do início?
Bom, ela seguiu o mesmo caminho, escolheu SER, e permitiu-se não fazer A escolha, apenas um compromisso, o de dar o melhor de si naquilo, dentro de seus limites, que acredita e, consequentemente, lhe dá prazer.